Recentemente, comprei um leitor de livros e, para estreá-lo em grande estilo, resolvi ler um livro que muito me foi recomendado: Torto Arado. O famoso e premiado livro de Itamar Vieira Jr. também é muito bem falado nas redes sociais. É claro que, como de costume (senão não é a Izabel), deixei umas leituras para traz (as quais já retomei rs) e devotei minha atenção à história dos moradores de Água Negra. Leitura concluída e aqui estou para falar das minhas impressões, sem spoiler. Então, me acompanhe!
Mas, antes disso, a sinopse:
Nas profundezas do sertão baiano, as irmãs Bibiana e Belonísia encontram uma velha e misteriosa faca na mala guardada sob a cama da avó. Ocorre então um acidente. E para sempre suas vidas estarão ligadas ― a ponto de uma precisar ser a voz da outra. Numa trama conduzida com maestria e com uma prosa melodiosa, o romance conta uma história de vida e morte, de combate e redenção.
Antes de falar do conteúdo, gostaria de começar falando da capa do livro, publicado pela Editora Todavia. A ilustração, assinada por Linoca Souza, tem como inspiração uma fotografia de uma série realizada em Camarões, por Giovanni Marrozzini. Mas, além de ser uma ilustração baseada numa foto, há um diferencial: ao invés dos facões, foram desenhadas espadas-de-São-Jorge (também conhecidas como espadas-de-Iansã ou espadas-de-Santa-Bárbara), planta originária do continente africano e que passa muito do laço entre as irmãs Bibiana e Belonísia e, mais ainda: como ambas são “enraizadas” com as coisas da terra, da religiosidade e, é claro, com a ancestralidade.
E é esta que inicia a trama. A representação da ancestralidade das filhas de Zeca Chapéu Grande é sua mãe, Donana, uma senhora que costuma a “falar com seus botões” e que esconde algo misterioso debaixo da cama. Num desses momentos de introspecção e afastamento de Donana da casa de barro, onde mora com a família do filho, suas netas, Bibiana e Belonísia fuxicam suas coisas e encontram o artefato que muda completamente a vida das duas.
Ler Torto Arado foi uma experiência única. Eu me impressionava muito em como a história ia ao passado e retornava ao presente no capítulo seguinte, de forma que eu não me perdia e sabia perfeitamente quem estava narrando no momento. O livro traz em sua narrativa muito do olhar feminino para as coisas, para as situações e para as pessoas. Tem religiosidade, luta, romance, derrota, alegria, tristeza, decepção, aceitação, surpresa… Um misto de emoções que faz o leitor se envolver cada vez mais com os personagens. Dividido em três atos (Fio de Corte, Torto Arado, Rio de Sangue), o romance apresenta a força das relações de um povo com sua terra, tendo que lidar com os desmandos dos senhores brancos que ali chegaram e se autodeclararam donos do que antes eram do povo indígena, do povo negro.
Se tem algo para pontuar de “negativo” (sim, com muitas aspas) em Torto Arado, seria a falta de uma contextualização quanto ao falar característico dos personagens, que se denominam quilombolas e estão ambientados no sertão da Bahia. Não que a linguagem de Torto Arado seja rebuscada, mas, diante de toda conexão que senti com as personagens, ficou faltando essa parte, que me deixou um tanto pensativa a respeito. Confesso que fui até mesmo ver se mais alguém pelas redes tinha sentido falta do mesmo que eu. E encontrei. Se assim fosse, seria algo belíssimo, não que o livro não o seja. Mas é apenas algo que eu, como leitora, senti falta.
E, portanto, independente disso, não há como não se sentir, de alguma forma inexplicável, abraçado por Torto Arado. O livro é uma amostra do amor dos habitantes pela terra e o amor desta para com eles. Chão no qual nascem, do qual provêm seus alimentos, no qual são enterrados quando a morte chega. Vieira Jr. nos mostra uma ligação muito bonita do homem com a natureza, de resistência e de identidade de um povo preto que luta pela terra a qual pertence e de que é dono.
“Eu sou Groot” e professora. Adoro assistir filmes e séries; ler livros e HQs e “eu QUERIA fazer isso o dia todo”. Espero ter “vida longa e próspera”…