Lemos: A Vinha Amaldiçoada

Ar puro e uma oportunidade de trabalho foi o que fez um homem se mudar com sua esposa, já que esta apresentou uma saúde debilitada. Mas a história do lugar escolhido para a mudança de ares faz de A Vinha Amaldiçoada um conto bem interessante e que promete uma leitura prazerosa, ainda mais com esse título. Mas será que o conto de Charles W. Chesnutt (1858-1932), publicado e traduzido pela Editora Escureceu, no Clube da Caixa Preta, é bom? Vem que eu te conto!

Mas antes da mudança, a sinopse:

O conto é narrado na perspectiva de Julius, um homem negro ex-escravizado que decide convencer um casal branco a não comprar uma determinada plantação de uvas na Carolina do Norte. Para isso, ele conta a história de Henry, um homem que ganhava e perdia forças devido a ingestão acidental de uvas enfeitiçadas.

Charles W. Chesnutt é um autor negro, descendente direto de família negra, que fora escravizada, com europeus. Ensaísta, ativista político e advogado, ele foi um dos primeiros escritores negros americanos. Charles poderia se passar por branco perante a sociedade por ter a pele muito clara, mas sempre se reconheceu como negro e assim também foi reconhecido pela comunidade negra. Seus contos e romances tratavam de questões complexas de identidade racial e social no sul dos Estados Unidos da pós-Guerra Civil e, desta forma, a história de A Vinha Amaldiçoada está inserida neste contexto histórico.

A história contada por Julius ao futuro possível comprador das terras John e sua esposa Annie tem muito suspense, que envolve os personagens, mas também envolve o leitor. Inicialmente, achei que se tratava de um conto de terror e, convenhamos que até mesmo o título nos induz a pensar desta forma e o tom soturno que se precede. Mas, ao longo da leitura, percebe-se uma estrutura folclórica sendo construída, o que sustenta o interesse pelo conto e a história em torno das deliciosas uvas scuppernong.

Ao finalizar A Vinha Amaldiçoada fiquei com um sentimento de ter ficado confusa ou de a minha interpretação ser errada. Mas, após o conto em si, há uma contextualização e hipóteses de quais teriam sido as intenções de Charles W. Chesnutt ao escrever este conto e, principalmente, pela figura de Julius, o personagem que narra a história do negro escravizado que perdia e recuperava s forças junto com a vinha, de acordo com as estações. Na minha opinião, toda história contada por Julius era uma tática do mesmo para não perder a oportunidade de aproveitar as suculentas uvas, uma vez que ele era uma pessoa ex-escravizada e queria continuar usufruindo da frondosidade da vinha, como se fosse uma reparação histórica. Mas não posso me alongar muito na reflexão que tive, pois posso dar spoiler.

A Vinha Amaldiçoada é um conto muito interessante, mas que seu final pode deixar algum leitor meio frustrado, assim como eu fiquei. Mas isso não impede de que você leitor, possa fazer a leitura do mesmo. Para isso, assine o Clube da Caixa Preta, que é uma excelente iniciativa de resgatar contos de autores negros que nunca foram traduzidos por aqui e que são de grande contribuição para discussões que ainda permeiam nestes tempos.