Lemos: Talma Gordon

Review of: Talma Gordon

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4
On 29 de janeiro de 2021
Last modified:29 de janeiro de 2021

Summary:

Com um título que já apresenta a sua protagonista, o conto Talma Gordon, de Pauline Hopkins (1859-1930), é conhecido como o primeiro conto de mistério escrito por uma mulher negra. Sendo este nunca antes publicado por aqui ou traduzido para o português, o Clube da Caixa Preta, que é um financiamento coletivo com a intenção de resgatar esses contos esquecidos (porém muito importantes) de grandes escritores negros, nos deu a oportunidade de entrar em contato com esta famosa e densa obra de Pauline Elizabeth Hopkins. Conto lido e aqui estou para falar sobre ele, mas sem spoilers. Me acompanhe!

Com um título que já apresenta a sua protagonista, o conto Talma Gordon, de Pauline Hopkins (1859-1930), é conhecido como o primeiro conto de mistério escrito por uma mulher negra. Sendo este nunca antes publicado por aqui ou traduzido para o português, o Clube da Caixa Preta, que é um financiamento coletivo com a intenção de resgatar esses contos esquecidos (porém muito importantes) de grandes escritores negros, nos deu a oportunidade de entrar em contato com esta famosa e densa obra de Pauline Elizabeth Hopkins. Conto lido e aqui estou para falar sobre ele, mas sem spoilers. Me acompanhe!

Antes de nos envolvermos nesse mistério, a sinopse:

Talma Gordon nasceu em meio à riqueza. Após a morte de sua mãe, a herança da família da matriarca, que deveria ser dela e de sua irmã, estranhamente, ficou sob total gestão de seu pai, que casou-se novamente e teve um filho. Mas, depois de retornar de uma viagem de estudos e ser recepcionada com uma grande festa, Talma Gordon viu sua vida virar do avesso, quando uma tragédia acontece na mansão de sua família e ela é acusada de ter cometido o crime. 

Um conto com roteiro incrível, Talma Gordon tem um pouco de trama policial, mas trata de questões como racismo, eugenia (um “estudo” em defesa da “raça pura”, de ser “bem nascido”, de “ser ‘puramente’ branco”) e colorismo (quando pessoas da mesma etnia são tratadas de formas diferentes de acordo com a cor da pele). Fazendo o leitor permear à história e sua ambientação, com uma discussões extremamente importantes, Pauline Hopkins as expõem com maestria, propondo uma grande reflexão, capaz de atingir o leitor, independente de sua etnia. É um mergulho na questão de como o(a) negro(a) é visto na sociedade: sendo uma maldição e tendo sua cultura e o seu estar na sociedade sendo demonizado e inferiorizado, sendo indigno de coisas boas com prosperidade, felicidade e amor.

Neste conto, consegui sentir as aflições de cada personagem e tentar imaginar suas possíveis feições, diante das circunstâncias às quais estes eram expostos. Tudo com uma narrativa soturna e misteriosa, capaz de induzir o leitor visualizar uma possível ambientação que combinasse com a mesma. Além disso, Talma Gordon é uma história dentro da história, de forma que um médico, numa reunião com homens importantes em sua casa, narra um fato ocorrido no passado e que o marcou muito, de forma a entreter seus convidados. Mesmo que, em dado momento o médico assuma a posição de narrador, há um narrador externo, que inicia toda a ambientação dessa reunião. Inclusive, há uma certa polêmica à escrita desse conto, pelo fato de Pauline Hopkins ser mulher e negra e ter dado boa parte da narração a um personagem homem e branco.

Talma Gordon é um conto que contém muitas camadas. Apesar de todo esse primor de trama, foi possível premeditar um outro mistério dentro da trama, que é apresentado de forma bem rápida, mas não o mistério que podemos ver na sinopse. Mas o interessante é que a autora propõe toda uma narrativa que encobre uma que é proposta anteriormente, de modo que o leitor a esqueça ou se perca por vezes. É um jogo interessante que, para alguns, pode parecer um recurso ruim ou que poderia ter sido melhor elaborado. Mas é algo a se relevar, visto que é um conto é de 1900 e deve-se levar em conta a época em que o mesmo foi escrito.

Envolvente e surpreendente, Talma Gordon é um conto que deixa o leitor apreensivo e cada vez mais interessado em descobrir o mistério que gira em torno da morte de uma poderosa família. Com sua escrita, Pauline Hopkins (1859-1930) me levou a imaginar cada situação, possíveis expressões e uma ambientação soturna em todo o conto. Ao término da leitura, ficou a prazerosa sensação de ter lido um ótimo conto e deste ter sido o primeiro escrito por uma mulher preta.