Para celebrar o Novembro Negro, mês em que se iniciam as celebrações e atuações que antecedem o Dia de Zumbi dos Palmares e Dia da Consciência Negra no dia 20 de novembro, a Editora Escureceu traduziu o conto De Tolos e Sábios, de Leila Amos Pendleton (1860-1938). Este, que foi fornecido aos assinantes do Clube da Caixa Preta, dialoga com temas importantes para discussões, como o apagamento histórico, cultural e étnico de civilizações africanas e seus feitos. Conto lido e aqui estou para falar sobre ele!
Mas, antes da primeira aventura, a sinopse:
A histórica e emblemática governante do Egito, Cleópatra, tem sua história narrada em um Santuário, sob a visão da Madre Superiora, Sallie Runner, e sob as reações das demais Irmãs, diante também da identidade racial de Cleópatra.
O conto tem início num encontro entre Irmãs do que parece ser um convento, em que aguardam a chegada da Madre Superiora para que esta dê início à reunião, pois está atrasada. A Madre propõe-se a contar a antiga história de uma mulher negra que era rainha do Egito, na África, que se chamava Cleópatra. Após vários “sins” a Madre Sallie começa a história. Basicamente, o conto de Leila Amor Pendleton é assim, uma leitura aparentemente simples e rápida.
Mas ela “esconde”, propositalmente, alguns temas importantes a serem debatidos, como quando a Madre é, breve e caltelosamente, interrompida por uma das Irmãs, quando esta põe em questão/ dúvida a cor da pele de Cleópatra, dizendo conhecê-la de outra forma, como com uma pele mais clara e rosada, por exemplo. Em De Tolos e Sábios, o leitor mais atento consegue perceber que o debate sobre a identidade racial de Cleópatra já estava em andamento, pelo menos durante a maior parte do século XX, já que o conto foi publicado na revista The Crisis, no ano de 1922.
Tal debate perdura até os dias atuais nas redes sociais, por exemplo, onde grupos expõem seus conhecimentos/ pesquisas com base em estudos feitos que afirmem a negritude de Cleópatra. Isso se deve ao fato da tentativa de “europizar” o que é africano, sejam pessoas, objetos, construções, criações que perduraram e contribuíram para outras civilizações. Esta última palavra, inclusive, me remete a muitos momentos ao longo da história em que os povos africanos foram vistos como não-civilizados, postos como animais e/ou aberrações, sendo exibidos em zoológicos, comparados à primatas (procure por Ota Benga) e tendo suas estruturas corporais postas como objeto de estudo (procure por Saartjie Baartman, a Vênus Negra). O embranquecimento de importantes figuras históricas ainda é promovido pelas mídias, seja na literatura, contando ou traduzindo uma história; ou ainda em adaptações cinematográficas ou televisivas, onde são escolhidos atores brancos para representar tais figuras (vide a novela ambientada na Bahia, cujo elenco era majoritariamente branco).
De Tolos e Sábios não foi um conto que me pegou e prendeu pela narrativa, mas vejo que o mesmo tem sua importância, principalmente por sua função, reforçando a negritude e africanidade do Egito. E o fato do mesmo ser o conto traduzido de novembro do Clube da Caixa Preta se fez necessário, diante de nos conscientizarmos e de conscientizar pessoas brancas do embranquecimento midiático e literário de narrativas negras, como forma de mais um apagamento histórico. Fato que, propositalmente, leva as pessoas a esquecerem de que o Egito é um país localizado no continente africano. Recomendo a assinatura do Clube e a leitura do conto.
“Eu sou Groot” e professora. Adoro assistir filmes e séries; ler livros e HQs e “eu QUERIA fazer isso o dia todo”. Espero ter “vida longa e próspera”…