Lemos: Serpentário

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5
On 1 de janeiro de 2020
Last modified:1 de janeiro de 2020

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Antes de 2019 encerrar, separei alguns livros para ler durante as férias. Dentre os títulos, estava Serpentário, obra que tive a honrar de adquirir diretamente com o Felipe Castilho na última CCXP. O plano era ler de forma vagarosa durante todo o mês de janeiro, mas “devorei” o livro em dois dias e cá estou para falar sobre.

Antes dos sibilares, a sinopse:

Todo ano, Caroline, Mariana e Hélio costumavam deixar a capital paulista para encontrar Paulo, um jovem habituado à simples vida caiçara. No entanto, a amizade construída nas areias do litoral sofreu abalos sísmicos no Réveillon de 1999, quando algo tão inquietante quanto o bug do milênio abriu caminho para uma misteriosa ilha que despontava no horizonte, e explorá-la talvez não tenha sido a melhor decisão.

Sobreviver à Ilha das Cobras tem um preço. O arquipélago é um ambiente hostil, tomado por víboras, e esconde segredos tão perturbadores quanto seus habitantes. Mais do que um equívoco darwiniano ou uma lenda popular, a ilha praticamente destruiu a vida deles. Entre memórias e fatos fragmentados, o que aconteceu naquela fatídica noite se tornou um mistério. Mas de algumas coisas eles se lembram perfeitamente: uma enorme e ameaçadora serpente, além de uma pessoa sendo entregue ao ninho da víbora, um sacrifício sem chance de recusa.

Anos depois, Caroline é confrontada com um de seus piores pesadelos: a pessoa que eles abandonaram está viva. Um fantasma do passado que surge para fazer suas certezas caírem por terra. Então, ela decide reunir os amigos para entender o que aconteceu. E talvez o encontro seja parte de algo maior… e maligno. Em Serpentário, Felipe Castilho mostra todo o seu talento ao mesclar referências do folclore e da mitologia a elementos da cultura pop, da ficção científica e do horror.

O primeiro aspecto que me chamou a atenção foram as escolhas do tempo narrativo. Castilho utiliza presente e passado para nos apresentar as personagens da história e as marcas que o fatídico Réveillon deixou neles. Talvez isso te faça lembrar de um livro sobre um certo palhaço, mas te digo que a semelhança se limita a isso. Serpentário tem outra pegada.

O tempo da narrativa segue de forma não linear e é essa escolha que coloca o mistério no livro. Sabemos que a pessoa esta viva, mas não sabemos como ela foi abandonada, como sobreviveu e tampouco das suas atuais motivações. Essas idas e vindas atiçaram a minha curiosidade e foram o fator principal para que eu lesse a obra tão rápido. Ainda sobre as diferentes linhas de tempo, o livro viaja para passados mais distantes e até para o futuro em diversos fragmentos de histórias que envolvem a Ilha das Cobras (que ao meu ver não é só cenário, mas também personagem).

Uma vez no passado, mas especificamente em 1999, Castilho bombardeia o leitor com inúmeras referências nostálgicas. Se você viveu essa época, vai identificar facilmente os equipamentos, programas televisivos, jingles, etc. Confesso que me senti bastante familiarizado na ambientação temporal e ri dos vários trashes noventistas que foram citados.

Porém, a graça acabou para mim quando as referências foram sobre o nosso contemporâneo… Em sua escrita, Felipe faz críticas pertinentes ao atual momento político, assim como alguns costumes da nossa sociedade. Se você está ligado às notícias, certamente não terá dificuldades de identificar algumas falas.

Finalizando as referências, porque o livro não é só isso, destaco a figura da serpente. Para introduzir as cobras em sua obra, Castilho pega elementos da cultura pop, mitologia e de clássicos da literatura especulativa para fazer um caldeirão fantástico acerca deste animal. Fica bem nítida a pesquisa e o cuidado que o autor teve para utilizar os símbolos e as metáforas.

Como último ponto, falarei das personagens. Confesso que não senti muita afinidade com a maioria deles. Talvez porque Felipe tenha retratado muito bem como é um “riquinho besta”, hahaha. Paulo foi sem dúvida o que mais se destacou para mim. Senti muita verdade vindo dele, mas vou limitar meus comentários a isso, porque nada de spoiler. Fora isso, em algumas vezes, Mariana me fez lembrar da minha adolescência rock n’ roll.

Serpentário tem uma narrativa fluida, divertida, misteriosa e como toda boa ficção deve fazer, nos coloca para pensar a realidade. O livro foi um excelente reencontro meu com um romance da dita fantasia urbana. O curioso é que separei o livro para ler no dia 27/12, mesma data em que Caroline retorna para o litoral. Coincidências à parte, recomendo demais que você leia.