Lovecraft Country chegou ao final da sua primeira temporada. A tão aguardada e falada série de ficção científica da HBO, que também foi uma das maiores estreias da plataforma HBO Max, trouxe o protagonismo negro para as telas, além de abordar temas fortíssimos, ambientados nos anos 50. Mas, apesar de carregar o nome de um autor que usava negros e asiáticos como monstros em suas obras, a série de Misha Green, adaptada do romance homônimo de Matt Ruff, traz à tona o verdadeiro monstro que, inclusive nos assombra até hoje: o racismo. Terminei de assistir, demorei para escrever, mas estou aqui para falar sobre a série, mas sem spoilers, é claro! Me acompanhe.
Mas antes, releia a sinopse:
A nova série de drama da HBO, baseada na história de Matt Ruff com o mesmo nome, estreia em agosto. A série acompanha Atticus Freeman (Jonathan Majors) que se une à sua amiga Letitia (Jurnee Smollett-Bell) e seu tio George (Courtney B. Vance) para embarcar em uma viagem de carro pelos Estados Unidos de 1950, em busca de seu pai desaparecido (Michael Kenneth Williams). Isto se inicia com uma luta para sobreviver e superar tanto os terrores racistas da América branca como os monstros aterrorizantes que poderiam ser tirados de uma história de Lovecraft.
Essa sinopse exprime apenas os primeiros episódios de Lovecraft Country, o que é perfeitamente compreensível, uma vez que a série vai muito além disso. Com um roteiro didático e imersivo, este último devido ao incômodo com algumas cenas, nos é apresentado o terror que é o racismo, em vários pontos em que ele nos fere. Sim, digo no presente, mesmo que a ambientação da série ocorra nos anos 50. As ofensas na fala e nos atos, a perseguição e violência policial, o preconceito com religiões de matrizes africanas, os estereótipos que nos é imposto pela sociedade e o que esta espera de nós… Falo assim, em terceira pessoa, porque Lovecraft Country me afetou (pode-se dizer positivamente) de muitas formas.
Nesta série, o protagonismo negro reina, de maneira positiva, diferente das obras de H. P. Lovecraft, consideradas de teor racista, principalmente com negros e asiáticos. Atticus Freeman (Jonathan Majors) é a chave para tudo nesta série, abrindo portas para outros grandes protagonismos, principalmente feminino. Ele é o herói, ele cumpre a sua jornada e, durante a mesma, ele traz à tona heroínas negras, mulheres fortes que passam ou que passaram pela sua vida e que deram uma potência imensa à série. Mas posso dizer que ele não trouxe apenas as heroínas, como Letitia Dandridge (Jurnee Smollett-Bell) e Hippolyta Freeman (Aunjanue Ellis): ao mesmo tempo, nasce uma forte vilã, que é Christina Braithwhite (Abbey Lee), capaz de qualquer coisa para conseguir um importante livro que, somado a Atticus, irá lhe proporcionar a imortalidade. Gostaria de destacar aqui também três personagens que amei nessa série e que tiveram uma importância imensa na construção dos personagens acima, que são George Freeman (Courtney B. Vance), tio de Atticus, sua filha Diana Freeman (Jada Harris) e Ruby Baptiste (Wunmi Mosaku), irmã de Letitia.
Mas, além dessas personagens importantes, temos a grandeza de Montrose Freeman (Michael Kenneth Williams), pai de Atticus e irmão de George. Digo grandeza, porque ele é o combustível para esta série, dada a sua evolução dentro da mesma. É um personagem que você, como espectador, vai tentando decifrar quem ele realmente é junto com ele, que nos promove atitudes surpreendentes e emoções variadas a cada episódio. É o personagem que carrega a parte mais densa da palavra que dá base à história, na minha opinião: sacrifício. E tais sacrifícios, sejam eles secretos ou não, interferem e muito nas relações entre os personagens.
O pano de fundo que ambienta o início desses sacrifícios, começa no massacre de Tulsa, em 1921, um fato cuja violência racial provocada por pessoas brancas, é óbvio, destruiu aquela que era considerada a “Wall Street Negra”, onde era possível vislumbrar um progresso considerável econômico e social da população negra norte-americana. É interessante que as duas últimas grandes séries HBO relembram esse momento trágico e vergonhoso da história americana, pois é de fato que tentam apagar esse acontecimento para o resto do mundo, já que, antes da série Watchman, eu não me recordo de ter ouvido falar sobre.
Trazendo à tona o verdadeiro monstro que é o racismo (e seus praticantes conscientes), Lovecraft Country foi capaz de me proporcionar um suor nas mãos, além de outras sensações, com um roteiro que provoca uma imersão com os momentos de tensão e medo pelo qual os personagens passam, deixando o espectador sempre atento. Por vezes, a exibição de corpos nus me pareceu desnecessária, mas em muitas foi precisa e brilhante. Cito isso, por Lovecraft Country ser uma série que carrega muito conteúdo, sem a necessidade desses artifícios. Vale ressaltar aqui também a trilha sonora incrivelmente impecável desta série, e também um podcast, o qual acompanhei a cada final de episódio, explicando cada referência e sensação passada em Lovecraft Country. Torço muito para uma segunda temporada, que está em negociação e, em quanto isso, já penso em ler o livro.
“Eu sou Groot” e professora. Adoro assistir filmes e séries; ler livros e HQs e “eu QUERIA fazer isso o dia todo”. Espero ter “vida longa e próspera”…